A Joana Sales e a Maria Dovigo são as duas mulheres a liderar a iniciativa dos encontros de Mulheres e Lusofonia que neste segundo ano terá lugar em Compostela da 6 a 8 de Abril sob o lema “Mulheres, Territórios e Memórias”.
A Joana é nascida em Lisboa, a Maria na Corunha e criou-se no bairro da Agra do Orçã. As duas são ativistas da associação feminista portuguesa UMAR (União de Mulheres Alternativa e Resposta), uma associação histórica fundada em 1976.
Qual é o objetivo dos Encontros Mulheres na Lusofonia”?
Joana: O principal foco é o de criar uma rede plural feminista de mulheres do espaço lusófono, potenciando um entrecruzamento de diálogos, de experiências e de conhecimento entre nós, resignificando, reconcetualizado o termo lusofonia, dando-lhe uma amplitude e profundidade feminista, internacionalista e pós-colonial.
Deste modo, parece-me que o reintegracionismo encaixa aqui bastante bem.
Maria: É promover diálogos entre mulheres que têm o português como língua, imaginar uma rede feminista e internacionalista no espaço da lusofonia que eu, como galega, preciso, diversificar os interesses do reintegracionismo para além do linguístico e do cultural e levar o conhecimento da diversidade social da lusofonia à sociedade galega. E, ao mesmo tempo, desenvolver identidade, discurso e ação em diálogo com as sociedades lusófonas. Nenhum povo sobrevive isolado, vive porque é reconhecido. E nós temos esse espaço internacional pela língua que herdamos das nossas avós.
Que conseguiram com o I Encontro no ano passado e que expetativas têm com o II deste ano?
M: No primeiro encontro, celebrado em Vilar de Santos, conseguimos levar histórias de vida de mulheres de diferentes origens e trabalhos de pesquisa sobre mulheres das diásporas e sobre mulheres e memória. Este segundo encontro será em Compostela, na sede da Academia Galega da Língua Portuguesa. Do “mapeamento” dos temas no primeiro encontro, passamos a delimitar mais o foco dos painéis, a procurar melhorar a conexão com o que se está a fazer localmente e a diversificar o programa paralelo às conferências. Pusemos o foco em quatro temas: as diásporas lusófonas na Galiza e em Portugal, a recuperação da memória das mulheres da(s) resistência(s) para a melhoria da vida cívica, as experiências locais (em Compostela) de defesa dos direitos das mulheres e as jovens ativistas. Também apostamos mais na divulgação do encontro junto de diversas instituições internacionais.
J: Pretendemos que, dada a itinerância destes encontros e por se realizar numa cidade maior, Santiago de Compostela, que atraia mais pessoas para o nosso programa. Este ano existirão mais atividades, incluindo sessões culturais à noite. Estamos curiosas por poder entrecruzar pessoas de diferentes diásporas e projetos de resgate de memória de diferentes geografias.
Qual é a conexão entre estes três grandes substantivos Mulheres, Territórios e Memórias?
J: A articulação desses 3 substantivos permite-nos uma amplitude infindável de abordagens sobre as mulheres da lusofonia. O termo mulheres, porque somos feministas e temos de dar a primazia a nós próprias – chegou a nossa vez! Territórios porque vimos de zonas geográficas muito diversas, com contextos históricos, sociais e culturais distintos; mas também da nossa própria ligação com a(s) nossa(s) terra(s) – a(s) de onde descendemos, nascemos e/ou vivemos – e quais os sentimentos que por ela nutrimos: pertença, amor, ódio, idealização, desenquadramento, negação, desprezo, saudade… E é desta relação pessoal, familiar e/ou coletiva que vamos estabelecendo com os nossos territórios, que chegamos à memória – onde tudo começa e tudo termina.
M: A lusofonia tem uma grande heterogeneidade social porque é descontínua geograficamente e aberta a diferentes espaços internacionais e porque o colonialismo português foi diferente em cada território. A experiência histórica, as narrativas, os conceitos, a cultura, a relação com a terra, a questão da raça, a diversidade linguística… são também diversas. Em grande medida a lusofonia vem sendo uma discussão sobre as heranças do colonialismo, no seu pior, a memória da escravatura e o racismo estrutural, a perpetuação da pobreza e da exclusão social, e no seu mais invisível, o ocultação da história de milhões de seres humanos forçados até data bem recente a servir o sistema colonial. Quando toda esta herança histórica e esta realidade social se contam da perspetiva das histórias de vida das mulheres a violência e as injustiças ainda se tornam mais evidentes.
Quem vai participar neste encontro? Que nos podem oferecer?
J: Para este encontro centra-se em 4 eixos: as jovens ativistas feministas – dando a conhecer e colocando em diálogo ativismos de alguns países lusófonos; espaços de memória das resistências; diásporas lusófonas na Galiza; experiências locais de Santiago de Compostela (dada a itinerância destes Encontros, queremos dar destaque à localidade que os recebe).
Estes 4 eixos podem propiciar reflexividades fundamentais para tentar conhecer este vasto espaço sociolinguístico, aos níveis: espacial (Galiza, Portugal, Brasil, PALOP); temporal (memória antifascista, memória anticolonial e ativismos feministas da atualidade); geracional (várias faixas etárias) e identitário (afrodescendentes da Galiza e de Portugal, jovens europeias e jovens africanas provenientes de grandes e de pequenos meios urbanos).
M: Convidamos duas jovens das diásporas lusófonas na Galiza, a Jéssica Azevedo e a Sónia Mendes da Silva, e a presidente da Djass-Associação de Afrodescendentes, de Lisboa, Beatriz Gomes Dias. Também convidamos a jornalista Diana Andringa, uma referência em Portugal na divulgação da memória do colonialismo, a Teresa Sales, coordenadora do projeto “Memória e Feminismos” da UMAR, e a Mariola Mourelo para nos falar do “Projeto Cárcere” da Crunha. Também participarão jovens ativistas dos núcleos da UMAR e de várias organizações de países africanos. Têm para oferecer-nos uma grande diversidade, por origem, por idade, por percursos vitais, por formação académica…
E as mulheres e pessoas interessadas podem participar dalguma maneira?
J: Seria ótimo se pudessem ajudar na divulgação e/ou participar neste evento nos dias 6, 7, e 8 de Abril de 2018 em Santiago de Compostela. Queremos que estes espaços sejam lugares de encontro e de partilha numa (re)descoberta feminista do espaço lusófono. Serão tod@s muito bem-vinda@s!
Mais informação em www.facebook.com/mulheresdalusofonia/