de Mariola Mourelo
«Nom podes definir algo como de bem comum para uma cidade, país ou qualquer outra comunidade de pessoas, se nom contribui ao bem universal de todes”
A cidade das Damas de Cristina de Pisano (Veneza,1364- França,1430)
Pode a economia feminista passar da teoria à prática?
A economia feminista e a ética dos cuidados som áreas de estudo e reflexom que nos têm servido para tomar consciência da desigual distribuiçom das tarefas necessárias para o funcionamento da sociedade, bem ilustrado polo já conhecido iceberg a representar o trabalho visível, produtivo e público realizado tradicionalmente por homens, e o invisível, reprodutivo e privado atribuído às mulheres.
Além do debate sobre a sua revalorizaçom no sistema, nos próprios grupos feministas têm recebido especial atençom levando-nos, nos últimos anos, a um trabalho de introspeçom em que identificamos a reproduçom do patriarcado nas nossas dinâmicas internas e públicas e procuramos entom um fazer diferente e feminista.
No caminho da teoria à prática temos encontrado grandes ganhos, mas também contradições e conflitos que é importante abordar e será neste e próximos números da Revirada que trataremos alguns deles com o objetivo de abrir o debate e expandir a aprendizagem.
O que som os cuidados no movimento feminista?
Assumimos os cuidados tal como os entendemos no sistema patriarcal, normalmente ligados à família e ao pessoal, abrindo o seu debate nas organizações com a parte afetivo-emocional — parte menos presente nas reivindicações públicas. Iniciamos assim um processo de autoaprendizagem e experimentaçom onde os sentimentos e experiências pessoais das integrantes do grupo adquiriram umha maior relevância. Espaços de escuta ativa, rondas de sentires, gestom emocional e de conflitos começárom a surgir, em maior ou menor medida, nos diferentes coletivos feministas. Muitas destas ferramentas partilhadas com outros movimentos sociais, mas no feminismo com umha clara intençom de dar coerência a umha ética dos cuidados inherente no próprio ideário.
Está o trabalho reprodutivo nas organizações invisibilizado?
No entanto, continuamos a invisibilizar umha grande parte dos trabalhos reprodutivos da organizaçom como som a planificaçom, execuçom e limpeza, comunicaçom interna, gestom emocional, financiamento ou avaliaçom das ações coletivas. Umhas tarefas que permitem a sustentaçom e vida da atividade grupal mas requerem dumha continuidade e compromisso que nem sempre é atraente. Gradualmente as mulheres que as assumem por consciência, responsabilidade e/ou “amor” vam ficando mais soas, com o consequente aumento de trabalho e frustraçom, ou vam abandonando-as, o que resulta na paralise ou desapariçom de projetos coletivos feministas.
Coidamos a liderança feminista?
Um outro âmbito a valorar é o do trabalho público e o poder reconhecido que implica, pois no feminismo, ao contrário do que acontece nos espaços masculinos, liderar, tomar a iniciativa ou representar o grupo é ainda um esforço. É verdade que era e é necessário questionar o poder patriarcal dentro do movimento, mas realmente nom fomos além dumha crítica a companheiras, às vezes extrema, que gerou um certo medo em assumir responsabilidades e lideranças vitais para a criaçom e manutençom do feminismo organizado.
Se nom é este o sistema organizativo que queremos, qual é?
Urge pois umha revisom interna e criaçom de alternativas a um modelo organizativo que claramente reproduz o iceberg do sistema patriarcal de desigualdade entre cuidadoras e cuidadas.
Com certeza a introduçom dos cuidados na nossa práxis ativista é o grande avanço do feminismo de base dos últimos tempos. Encontrar o equilíbrio entre cuidados pessoais, políticos e estruturais e a açom, fazê-lo fora da ordem simbólica dos homens, e beneficiando a todas, como diz Christine de Pizan, é o grande desafio.
E ti que pensas?
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Podes consultar sobre economia feminista: Amaia Pérez Orozco, Yayo Herrero, Carol Gilligan e Nuria Varela e sobre gestiom coletiva com perspetiva feminista no Manual “Eines per a la gestió col-lectiva” de Filalagulla
(continuará)